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sobre o Sonho dos 4 Animais de Daniel
Rodnei Cecarelli
Daniel capítulo 7:1-8, ARA
1 No primeiro ano de Belsazar, rei da Babilônia, teve Daniel um
sonho e visões ante seus olhos, quando estava no seu leito; escreveu logo o
sonho e relatou a suma de todas as coisas.
2 Falou Daniel e disse: Eu estava olhando, durante a minha visão da
noite, e eis que os quatro ventos do céu agitavam o mar Grande.
3 Quatro animais, grandes, diferentes uns dos outros, subiam do
mar.
4 O primeiro era como leão e tinha asas de águia; enquanto eu
olhava, foram-lhe arrancadas as asas, foi levantado da terra e posto em dois
pés, como homem; e lhe foi dada mente de homem.
5 Continuei olhando, e eis aqui o segundo animal, semelhante a um
urso, o qual se levantou sobre um dos seus lados; na boca, entre os dentes,
trazia três costelas; e lhe diziam: Levanta-te, devora muita carne.
6 Depois disto, continuei olhando, e eis aqui outro, semelhante a
um leopardo, e tinha nas costas quatro asas de ave; tinha também este animal quatro
cabeças, e foi-lhe dado domínio.
7 Depois disto, eu continuava olhando nas visões da noite, e eis
aqui o quarto animal, terrível, espantoso e sobremodo forte, o qual tinha
grandes dentes de ferro; ele devorava, e fazia em pedaços, e pisava aos pés o que
sobejava; era diferente de todos os animais que apareceram antes dele e tinha
dez chifres.
8 Estando eu a observar os chifres, eis que entre eles subiu outro
pequeno, diante do qual três dos primeiros chifres foram arrancados; e eis que
neste chifre havia olhos, como os de homem, e uma boca que falava com
insolência.
A descrição da visão do profeta Daniel se
estabelece para muitos estudiosos tanto com uma interpretação profética pretérita
quanto histórica e, para alguns outros, também escatológica. A profecia é
apresentada na forma alegórica usando os animais como figura de linguagem para
descrever situações, reinos, políticas e governos que deveriam se suceder àquela
época. No verso 1 está assegurado quando foi registrada a visão. Segundo os
historiadores, o tempo do rei Belsazar era época de decadência social do Império
Babilônico.
No verso 2a a figura dos quatro ventos do céu
parece estar relacionada com os quatro pontos cardeais ou aos quatro cantos da
terra, ou as quatro estações etc., um figurativo de tempos e lugares. De acordo
com a numerologia bíblica o número quatro é o número da terra, da criação,
referindo então a um evento criado, terreno e não espiritual (2). Entretanto,
alguns autores sugerem que a palavra hebraica para vento ou sopro, ru’ah, teria conotação espiritual, sendo
então um vento divino. Mas este argumento isolado nos parece inconsistente
porque colocaria Deus na posição de gerador da história e não como controlador
da história. Usualmente na Bíblia a palavra ventos
(plural) está associada a rumores.
No verso 2b, os ventos agitavam o mar
Grande. Na tipologia bíblica o mar significa povos, nações governos, política.
Mar Grande ou Grande Mar era como os povos da época se referiam ao Mar Mediterrâneo.
Resumindo, o verso 2 quereria dizer que da agitação dos povos e nações
surgiriam reinos e/ou impérios com diferentes políticas de governo na área do Mediterrâneo.
De acordo com a descrição do verso 3 há uma sequência lógica no surgimento de
espécies animais apresentando padrão na natureza de domínio territorial e
predador de topo de cadeia alimentar, simbolizando poderio natural.
No verso 4, o primeiro era como um leão com asas de águia. Na Mesopotâmia, o leão alado com rosto humano era chamado de kerubo, que em acadiano significa guardião, estava associado à figura do deus Marduk e era símbolo do Império Babilônico. Alguns autores sugerem a interpretação de que o leão com asa de águia representaria força associada à velocidade das conquistas iniciadas por Nabopalasar e concretizadas pelo seu filho Nabucodonosor. No entanto, o Império Babilônico (chamado de Segundo Império ou Neobabilônico) foi efêmero não durando mais duas gerações.
A visão das asas sendo arrancadas sugere os eventos posteriores à subida ao trono de Nabonide, filho de Nabucodonosor e pai de Belsazar, acompanhada do aumento da degradação moral da Babilônia, afundada em corrupção devido ao refinamento das suas riquezas e apatia da sua opulência. O reis que se deificavam pelas suas conquistas foram, na cinética do verso 4d, “levantados da terra” (isto é, da religião, divinização) e colocados “de pé como homem e com mente de homem” (humanização). A degradação social levou a perda da força e da vontade de conquistar causando o enfraquecimento do império. Conta-se que Ciro, rei da Pérsia, entrou na cidade quase sem resistência e aplaudido pelo povo.
proporções quando despertada. Uma personalidade similar à política do Império Medo-Persa. Ciro, o Grande, também chamado de Rei dos Reis, foi o rei persa que derrotou os medos, mas não os aniquilou, formou uma confederação com eles e um corpo de exército beirando 2 milhões de homens. Este foi o rosto da diplomacia de Ciro. Quando seu exército chegava a uma cidade, ele oferecia ao rei local uma aliança: não resista, seja meu amigo, pague meus tributos e continue reinando. Se houvesse resistência, a força empregada era desproporcional. Os reis persas tinham muita consideração com as leis e os direitos. O sucessor de Ciro, o medo Dario, fez o mesmo tipo de política e diplomacia, com respeito a direitos e deveres de governantes e governados. Relatos históricos contam que uma das frases empregadas amiúde por Dario foi__ “sou amigo do que é correto”. Portanto a interpretação de alguns estudiosos de que o urso representaria a crueldade dos persas é improcedente. Em uma escala de crueldade podemos colocar os assírios como muito cruéis porque usavam o empalamento como forma de tortura e terror e a deportação como forma abater para subjugar; os babilônicos como cruéis porque saqueavam as riquezas dos derrotados e escravizavam povos para dependerem do império para sobreviver; os persas como pouco cruéis porque procuravam o domínio pela estratégia das co-regências nas satrápias.(3)
O destaque no verso 5b ao ato de se levantar
sobre um dos lados representou a ascensão do persa Ciro dominando sobre os
medos e formando uma confederação denominada Império Aquemênida. Há um firme
consenso entre os historiadores de que a figura do urso com três costelas entre
os dentes representa os três grandes impérios que foram aniquilados pelos
persas: A Lídia, descendentes do Reino Hitita, a Babilônia e o Egito. Estes
impérios deixaram de existir após as conquistas persas e nunca puderam se
reerguer (verso 5d “Levanta-te, devora muita carne” ).
No verso 6 esta descrito o outro animal semelhante ao leopardo. O leopardo na natureza é um animal com habilidades de caça que usa agilidade somada a força para surpreender a vitima com rapidez. O simbolismo do leopardo se encaixa perfeitamente no comportamento do Império Macedônio, que despontou mundialmente no século V AC, principalmente com Alexandre, o Grande. A descrição das 4 asas como de ave representa a rapidez das suas táticas de guerra para efetuar suas conquistas, o quadrado de guerra hoplita ou falange macedônia e as quatro cabeças seus 4 generais: Cassandro, Ptolomeu, Lisímaco e Selêuco.
A vitória dos macedônios ao dominar o
Peloponeso deveu-se a mudança das técnicas de combate hoplita que usava a linha
de combate ombro-a-ombro em 2-3 fileiras, formando uma couraça de escudos
redondos que apoiavam uma lança média que alcançava 2-3 fileiras de
combatentes. As táticas de combate tinham certa plasticidade podendo a formação
mudar dependendo do curso da luta. Foi muito usada pelos helenos Esparta e
Atenas e também pelos persas. Quando Felipe, o Bárbaro, pai de Alexandre começou
seu avanço pelas cidades gregas, já trouxera a modificação da formação clássica
hoplita para a falange, um quadrado que podia se movimentar com uma formidável
força frontal de esmagamento do inimigo. Era constituída de 10 ou mais fileiras
cerradas e lanças longas de vários tamanhos que se estendiam da última fileira
até a primeira apoiada nos ombro dos combatentes. A fraqueza lateral da falange
era compensada pela posição da cavalaria.
Quando assumiu o trono macedônio Alexandre
passou a empregar estas técnicas militares e aperfeiçoa-las sobremaneira,
usando de táticas ousadas de combate. Alexandre sempre usou suas forças com
velocidade de manobra e, mesmo em menor número, nunca perdeu uma batalha. Foi um
dos comandantes militares mais bem sucedido na história tornando-se referência
em táticas de guerra até hoje. Alexandre estendeu o Império Macedônio a toda Ásia
Menor, até parte da Índia e submeteu todo o Império Persa ( verso 4d “e
foi lhe dado domínio” ). Entretanto, este domínio não se constituiu
de somente conquista territorial, estendera-se muito além. O domínio cultural
fora firmemente estabelecido com a helenização das terras conquistadas, difusão
da religião, cultura e língua gregas, especialmente o dialeto grego popular, o koiné, falado pelas tropas e pelos
comerciantes. Tornou-se marco cultural da humanidade, constituindo o período
helenístico da história. Após a sua
morte, o império foi dividido entre os seus 4 generais. Cassandro reinou sobre Macedônia
e Grécia, Lisímaco reinou sobre a Trácia e a Ásia Menor, Ptolomeu reinou sobre
o Egito criando a dinastia ptolomaica e Selêuco reinou sobre a Síria e
Palestina, criando a dinastia selêucida. Desta última dinastia surgiu o rei Antíoco
Epifânio, grande perseguidor do povo judeu, envolvido com as Guerras Macabéias
(4). Este rei também é retratado como um chifre dentre outros chifres em Daniel
8, na visão do carneiro e do bode. Não obstante a similitude de chifres, não
haveria relação com o quarto animal de Daniel 7.
O quarto animal da visão de Daniel foi
rotulado de terrível, espantoso, sobremodo forte...diferente de todos
os outros...O
cerne desta descrição mostra uma espécie animal desconhecida. A ação deste
animal é tríplice: devorava, fazia em pedaços e pisava o
que sobrava. Possuía grandes dentes de ferro e dez chifres. Para
interpretar a alegoria é necessário permanecer no viés de raciocínio de que os
animais provindos do mar significam sistemas políticos e governanças, credo ut intelligam (creio em ordem para
que possa entender; Anselmo de Bec, sec. XI).
.Devorava: exercia forte domínio político sobre nações.
.Fazia em pedaços: dividia as nações dominadas.
.Pisava o que sobrava: retaliava nações que resistiam.
.Grandes dentes de ferro: forte poderio militar.
.Dez chifres: O número dez e o seu multiplicativo decimal nas
Escrituras significam ordem, perfeição de entrosamento ou ajustamento, aliança
forte, plenitude de organização (2). Dez chifres, então, seria a perfeita
integração de um sistema político de governabilidade com êxito. Pela lente da
numerologia, os dez chifres não teria um valor numeral nem seriam, especificamente,
dez nações, ou dez reinos, ou dez governantes e sim um valor simbólico de
aliança bem consolidada de estados com mesma ambição política. Na natureza chifre simboliza força. Na
alegoria representaria poder político, poder de governo, poder do estado.
A simbologia que envolve o quarto animal começa com o crescimento do Império Romano e sua máquina militar, sendo aprimorada continuamente incorporando técnicas de formação de batalha e tática de combate quer dos gregos, persas e cartagineses. O quarto rei romano, Sérvio Túlio, já enfatizava a tática de divisão de batalha das legiões em centúrias de classes sociais e experiência de combate. Mais tarde, durante a República, adotou-se a formação manipular, unidades de 120 homens, em seguida, durante o Império formação das coortes. As técnicas de combate romanas eram normalmente irresistíveis permitindo a Roma dominar o mundo conhecido durante muitos séculos, impondo sua política de domínio, a Pax Romana, a todos os povos. O quarto animal, por conseguinte, é um apanágio de Roma: exercia forte domínio político sobre nações, dividia as nações dominadas, retaliava nações que resistiam, usava um forte poderio militar para exercer governabilidade de sucesso.
O último século de Roma, já cristianizada,
foi um tempo de fragmentação do seu império ocidental pela independência das
províncias e a criação de novas nações, que vieram a formar a Europa e constituem
atualmente a Comunidade Europeia. Estes fatos levaram alguns estudiosos a
considerar que os dez chifres do quarto animal de Daniel seriam dez nações
resultantes da partição do império ocidental. Contudo parece mais uma tentativa
oportunista para encaixar o histórico no profético e vice-versa. A fascinante interseção
histórica, na verdade, é que a maior parte destas nações foi formada por povos
descendentes do filho de Noé chamado Jaffé. Estes povos são
conhecidos como caucasianos e/ou indo-germânicos que usam idiomas de base linguística
muito semelhante chamado de ramo indo-europeu. O império romano oriental cuja
capital era Constantinopla foi conquistado pelos povos de origem árabe ou
ismaelita e de outros povos do Oriente Medio e do Levante, que seguiam a
doutrina religiosa Islamita. A maioria destes povos são descendentes do filho
de Noé chamado Sem, et pour cause,
povos ditos semitas.
Ao longo do domínio do quarto animal a força
dos seus chifres estaria na evolução da sociedade e dos regimes e doutrinas
políticas, legislações, decretos, filosofias e tudo relativo à ciência e
antropologia social ao longo dos séculos da cultura Greco-Romana que perdura
até o momento, conhecido como o Humanismo Secular. Destarte, filosoficamente, a
maioria do conhecimento humano foi gerada pelos filhos de Jaffé associado a um
descendente de Sem, neste caso Judá.
O verso 8 da visão relata que três chifres
são arrancados para dar lugar a um novo chifre. Inicialmente pequeno, que mais
adiante em Dn 7:20, referido como mais forte, com olhos e uma boca que falava
insolências (ARA) ou arrogância (NVI) ou grandiosamente (ARC), grandes coisas
(ASV). A retirada de três chifres mostra uma mudança na arquitetura política do
conjunto para o surgimento de outro chifre, ficando a besta com 7+1 chifres. O numero 7+1 nas escrituras está
especialmente relacionado com ressurreição e regeneração, e o começo de uma
nova era ou nova ordem (2). Devido à evolução antropológico-social ao longo dos
séculos de desenvolvimento humano, o poder político mundial precisou ser
reestruturado para começar uma nova era. Uma transição para adequação,
estabelecendo os 7 chifres (conclusão perfeita ou completa) +1, perfazendo 8
(mais que perfeito ou superabundante). Por esta razão o oitavo chifre falava “grandes
coisas ou grandiosamente”, pois falava arrogantemente da nova da
estrutura criada, um perfeito governo mundial. Adicionalmente e
concomitantemente, esta estrutura política exerce perfeito controle e
vigilância sobre a sociedade, a saber, o chifre com olhos.
Este animal tem
grande similaridade com a besta quimérica que sobe do mar em Apocalipse 13:
1 Vi emergir do mar uma besta que tinha dez
chifres e sete cabeças e, sobre os chifres, dez diademas e, sobre as cabeças,
nomes de blasfêmia.
2 A besta que vi era semelhante a leopardo, com
pés como de urso e boca como de leão. E deu-lhe o dragão o seu poder, o seu
trono e grande autoridade.
Esta quimera também não seria uma pessoa,
apesar de alguns estudiosos acharem que seria um governante de uma confederação
de nações. Parece mais um sistema político de governo muito bem estruturado e
alicerçado no humanismo com objetivo de governar o mundo. Divagando
propositalmente dentro do universo da história dos povos e nações poder-se-ia
especular o 7+1 sendo o domínio mundial exercido pelos descendentes dos 7
filhos de Jaffé + 1 de Sem, neste caso poderia muito bem ser o Islã ( há uma
profecia do messias islâmico ou Mahdi ).
.Dez chifres: completo na sua estrutura.
.Sete cabeças: perfeito na sua organização.
.Dez diademas: absoluto no poder de governo.
.Parte leopardo: domínio político-cultural, Macedônia.
.Boca de leão: domínio político-territorial, Babilônia.
.Pés de urso: domínio político-diplomático, Pérsia.
Na tipologia escatológica, significaria
perfeito domínio político-cultural-científico-tecnológico-econômico-financeiro
da diplomacia mundial. Estas premissas são atualmente redigidas pela ONU,
UNICEF, WHO, FAO, UNESCO, AIEA, FMI, Banco Mundial, PAM, TPI, G7, G8, G20 etc.
e estão muito bem documentadas, são públicas, mas poucos têm acesso (5). Estão
sendo gradativamente administradas às nações há muitos anos de acordo com um
plano de domínio humanista, geração de um controle mundial para buscar uma nova
ordem de governança. Procura excluir gradativamente a influência das religiões,
principalmente as abrahmicas, no comportamento social da humanidade, “sobre
as cabeças nomes de blasfêmias”.
REFERÊNCIAS
1.Andrade, C.C.
Dicionário de Escatologia Bíblica.
Editora CPAD. 3⁰ Edição, Rio de
Janeiro, 2000.
2.Bullinger, E.W. Number in Scripture, its Supernatural Design and Espiritual
Significance. 4th Edition, Bible Warehouse, London, 1921.
3.História em
Revista. A Elevação do Espírito
600-400 AC. Time-Life Books, Edited by van Tulleken, K. Edição em português
por Editora Cidade Cultural, Rio de Janeiro, 1989.
4.Mesquita,
A.N. Povos e Nações do Mundo Antigo.
Editora JUERP, 4⁰ Edição, Rio de Janeiro, 1983.
5.Sanahuja,
J.C. Poder Global e a Religião
Universal. Editora Ecclesia, 1ₐ Edição, Campinas, 2012.
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